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Políticas públicas frente às soluções extrajudiciais de conflitos: Conciliação, Mediação e Arbitragem

Políticas públicas frente às soluções extrajudiciais de conflitos: Conciliação, Mediação e Arbitragem

25 jul, 2014 | Adam, Adam Sistemas, AdamNews, Arbitragem, Conciliação, Mediação, Notícias | 0 Comentários

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Vanessa Holvorcem Casanova
O presente artigo refletiu sobre os aspectos relevantes acerca da morosidade do sistema judiciário e sua intensa sobrecarga, assim como a necessidade de políticas públicas que versem sobre os meios extrajudiciais para a resolução de conflitos.
RESUMO
O presente artigo refletiu sobre os aspectos relevantes acerca da morosidade do sistema judiciário e sua intensa sobrecarga, assim como a necessidade de políticas públicas que versem sobre os meios extrajudiciais alternativos para a resolução de conflitos no seio da sociedade, de forma a efetivar a atuação da justiça. O Poder Judiciário deve lidar com intensa conflituosidade nas relações sociais; esta conflituosidade se dá pela garantia de acesso à justiça garantida a todos os cidadãos. Foram explorados aspectos relevantes acerca da sobrecarga do Poder Judiciário Nacional, conceituadas políticas públicas no contexto social brasileiro e identificada a necessidade de políticas públicas para acesso à justiça e seu caráter constitucional; tão logo identificadas as atuais políticas públicas voltadas para as formas alternativas de solução de conflitos: a conciliação – na qual uma figura conciliatória sugere um acordo de transação entre as partes; a mediação – na qual uma figura mediatória estimula o diálogo entre as partes, sem sugestionar; e a arbitragem – na qual uma figura arbitral, de conhecimentos jurídicos, aprecia o litígio a fim de solucioná-lo, de forma mais eficaz que o juízo normal. Dessarte, perpassa-se por uma precursora e vindoura mudança de mentalidade e cultura na resolução das controvérsias, através da construção de um modelo de justiça comunitária.
1. INTRODUÇÃO
Anteriormente ao surgimento do Estado, os conflitos sempre existentes na convivência social eram solucionados de acordo com a cultura de cada época. Basicamente, eram solucionados através dos sistemas de autotutela e de autocomposição. Na autotutela havia a expressão da força dos indivíduos em impor-se e imperar sobre o mais fraco. No entanto, o sistema de autocomposição continha três aspectos: desistência, submissão e transação. (OLIVEIRA, 2012).
De acordo com o autor, havia desistência quando o titular do direito renunciava à sua pretensão, liberando o sujeito passivo; havia submissão quando o sujeito passivo renunciava à sua resistência anteriormente oferecida à pretensão do autor; e, por fim, havia transação quando as duas partes faziam concessões recíprocas acerca do interesse em conflito.
Após a institucionalização do Estado, coube-lhe a responsabilidade sobre a solução do litígio, cumulando o dever de buscar formas de assegurar a satisfação dos direitos daqueles que o titularizaram nesta posição, destinando-se, portanto, a proporcionar uma convivência harmoniosa entre os indivíduos.
Ocorre que, atualmente, o Estado não dá conta da demanda crescente da sociedade. A crítica à sua atuação na solução de conflitos se deve ao fato do excesso de burocratização dos serviços, morosidade, custos elevados e má qualidade da prestação jurisdicional, frente a demandas contemporâneas produzidas por uma sociedade que avança tecnologicamente. (KLUNK, 2012).
O Poder Judiciário Nacional lida com grande responsabilidade frente a sua excessiva sobrecarga de processos, que resulta na crise de sua efetividade. Para Rafael Tadeu Santos de Souza, o processo efetivo é aquele que respeitado o equilíbrio entre os valores de celeridade e segurança, oferece as partes o resultado desejado pelo direito material. Ou seja, há duas condicionantes para que ele seja efetivo: a verdadeira realização da justiça e a celeridade processual.
Em contrapartida às transformações da sociedade brasileira, surge a necessidade de políticas públicas que arquem com esta carência do nosso sistema estatal: formas alternativas de solução de conflitos, de forma a descarregar o poder judiciário. Atualmente, são a conciliação, a mediação e a arbitragem.
A sociedade moderna carrega em si paradigmas de uma cultura na qual os conflitos devem ser resolvidos através da prestação jurisdicional. Outrossim, esta cultura ainda predomina ao tempo em que se observa uma ampliação da conscientização das pessoas acerca da melhor forma de resolver os seus conflitos sociais. E ainda que grande parte dos conflitos venham sendo solucionados extrajudicialmente, não é o suficiente para descongestionar o trânsito de inúmeros processos que permanecem e são instaurados no Judiciário.
Entretanto, o Poder Judiciário disponibiliza aos indivíduos novas formas alternativas de solucionar conflitos, evitando, assim, a formulação da lide. Esta medida, além de diminuir a sua sobrecarga, garante a efetividade do acesso a uma justiça justa pelo cidadão.
2. A CRISE DA JURISDIÇÃO E A NECESSIDADE DE POLÍTICAS PÚBLICAS DO PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO
É de indubitável percepção o descompasso entre a função jurisdicional do Estado e a complexibilidade conflituosa atual. A crise da jurisdição surge não tão somente através das controvérsias existentes entre os indivíduos e os consequentes conflitos, mas sim pela tutela jurisdicional sobre estes litígios, um direito de acesso à justiça intrínseco a todo cidadão, como parte de sua personalidade jurídica. Ou seja, os indivíduos, ao formarem relações conflituosas com os membros do seu grupo social, por conta de divergências em seus interesses, procuram a justiça.
Alguns desses conflitos são levados ao Judiciário por meio de ações coletivas, mas em grande maioria é judicializada individualmente, ocasionando, algumas vezes, o fenômeno de processos repetitivos, gerando uma sobrecarga ainda maior dos serviços do judiciário.
A justiça nunca poderá recusar a tutela pela tensão existente, seja pelo princípio da igualdade, em que todos têm o direito igualitário ao acesso à justiça e perante a lei, sendo-lhes garantido o devido processo legal; seja pelo compromisso elementar assumido pelo judiciário para com a sociedade. Portanto, a busca pela tutela jurisdicional deriva, principalmente, da afirmação de direitos garantidos pela própria Constituição Federal.
O mecanismo predominantemente utilizado pelo judiciário é o da solução adjudicada dos conflitos, que se dá por meio de sentença do juiz. E a predominância desse critério vem gerando a chamada “cultura da sentença”, que traz como consequência o aumento cada vez maior da quantidade de recursos, o que explica o congestionamento não somente das instâncias ordinárias, como também dos Tribunais Superiores e até mesmo do Supremo Tribunal Federal. Mais do que isso, vem aumentando também a quantidade de execuções judiciais, que sabidamente é morosa e ineficaz. (WATANABE, 2011, p. 2).
A atuação da jurisdição busca a garantia da pacificidade na convivência entre os indivíduos, munindo-se do poder de coerção. Ademais, perpassando pelo sistema jurisdicional uma explosão de conflitos, este não consegue responder a todos os litígios demandados de forma plenamente eficaz, o que resulta na morosidade da prestação jurisdicional, do acúmulo de ações, e outras tardanças.
Para José Luis Bolzan de Morais:
Vivemos, por isso, um momento de desacomodação interna, onde há um aumento extenso e intenso de reivindicações de acesso à Justiça, quantitativamente e qualitativamente falando, em contraposição a instrumentos jurisdicionais notoriamente insuficientes e ineficientes para atender e satisfazer subjetiva e objetivamente o conjunto de demandas que lhe são propostas. (MORAIS, 1999, p. 106).
Diz-se a crise da jurisdição a partir do século XX através da facilidade do acesso à justiça e especialmente pela explosão da litigiosidade, gerando um permanente desafio na busca pela constitucionalização e efetivação dos direitos e garantias individuais e coletivos fundamentais.
Verificou-se, então, intenso processo de judicialização com a transferência dos conflitos sociais para o Poder Judiciário, fortalecendo o ativismo judicial ao mesmo tempo em que as autoridades administrativas crescentemente adotaram procedimentos semelhantes aos judiciais. O surgimento de novos direitos difusos e coletivos, aliado a novos procedimentos judiciais, permitiram a intensa invasão do direito na organização da vida social e política. (HELENA, 2006).
2.1 Políticas públicas no contexto social brasileiro
Através do exposto em relação à crise do judiciário, conclui-se a imperiosidade de estabelecer uma política pública de tratamento adequado de conflitos que ocorrem na sociedade. É decorrente a crise mencionada da falta dessa política pública.
Podemos conceituar política pública como sendo, normalmente, um conjunto de ações e medidas do governo instituído pelo interesse comum, de maneira a gerar a solução de um problema que chama a atenção do Estado. A política pública, normalmente, é instituída tendo como base conceitual os problemas da esfera pública. O Estado Brasileiro resguarda um viés autoritário muito forte nas políticas públicas do país.
Para Elenaldo Celso Teixeira:
As políticas públicas traduzem, no seu processo de elaboração e implantação e, sobretudo, em seus resultados, formas de exercício do poder político, envolvendo a distribuição e redistribuição de poder, o papel do conflito social nos processos de decisão, a repartição de custos e benefícios sociais. Como o poder é uma relação social que envolve vários atores com projetos e interesses diferenciados e até contraditórios, há necessidade de mediações sociais e institucionais, para que se possa obter um mínimo de consenso e, assim, as políticas públicas possam ser legitimadas e obter eficácia. (TEIXEIRA, 2002).
Ainda de acordo com o autor:
As políticas públicas visam responder a demandas, principalmente dos setores marginalizados da sociedade, considerados como vulneráveis. Essas demandas são interpretadas por aqueles que ocupam o poder, mas influenciadas por uma agenda que se cria na sociedade civil através da pressão e mobilização social. Visam ampliar e efetivar direitos de cidadania, também gestados nas lutas sociais e que passam a ser reconhecidos institucionalmente. Outras políticas objetivam promover o desenvolvimento (…). (TEIXEIRA, 2002).
Logo, as políticas públicas, em sua generalidade, refletem os interesses da sociedade, sendo estabelecidas neste sentido. São legitimadas pelo Estado no cumprimento de seu dever de atender a sociedade como um todo, de forma universalizada. Tornam-se necessárias ações estratégicas que concretizam objetivos e atendem às reivindicações do povo.
2.2 Políticas públicas de acesso à justiça e seu caráter constitucional
O Sistema Judiciário, ao adotar uma política pública de tratamento adequado dos conflitos de interesses e diminuir sua sobrecarga, zela pela busca de efetividade e rapidez na sua jurisdição, assim como torna efetivo o princípio constitucional de acesso à justiça, previsto no inciso XXXV do art. 5º da atual Constituição Federativa. Acima de qualquer outro benefício, há o dever assumido pelo Estado perante a sociedade ao assumir a responsabilidade em garantir a pacificidade social; logo, a busca por uma convivência e solução pacífica de conflitos está acima de qualquer objetivo.
Ademais, o acesso à justiça previsto na Constituição Federal não garante o mero acesso aos órgãos do Poder Judiciário, mas o acesso à ordem jurídica justa, de forma efetiva e adequada. Conforme afirma Kazuo Watanabe (2011, p. 5), os serviços de tratamento de conflitos devem ser organizados por todos os meios adequados, não apenas por meio da adjudicação de solução estatal em processos contenciosos, cabendo-lhe em especial institucionalizar, em caráter permanente, os meios consensuais de solução de conflitos de interesses, como a mediação, a conciliação e a arbitragem.
Por meio dessa política pública judiciária, que proporciona aos jurisdicionados uma solução mais adequada dos conflitos, o Judiciário Nacional estará adotando um importante filtro da litigiosidade, que ao contrário de barrar o acesso à justiça, assegurará aos jurisdicionados o acesso à ordem jurídica justa, e, além disso, atuará de modo importante na redução da quantidade de conflitos a serem ajuizados e também, em relação aos conflitos judicializados ou que venham a ser judicializados, a sua solução pelos mecanismos de solução consensual dos conflitos, o que certamente determinará a redução substancial da quantidade de sentenças, de recursos e de execuções judiciais. (WATANABE, 2011, p. 3).
Estas formas alternativas de soluções de conflitos desvinculam-se da dominância do poder da jurisdição do direito, sendo possível decidir com base na equidade. Têm o objetivo de conferir maior qualidade à prestação jurisdicional, colocando em segundo plano uma resolução estatal imperativa. Estimulam uma solução de negociação entre as partes, evitando o contraditório técnico através da tentativa de acordos, o prolongamento do processo com produção de provas, interposição de recursos, entre outros atos processuais que igualmente retardam o processo, embora necessários ao seu trâmite, de forma inerente, quando este instaurado.
Contudo, a utilização de meios extrajudiciais para resolução das controvérsias não substitui a atuação do Poder Judiciário, pois estes instrumentos cumprem com a função de auxiliar na manutenção de um Estado Democrático de Direito. Em suma, são exercidos em prol de uma sociedade fraterna, pluralista e pacífica. Aliás, elementos constantes no texto do preâmbulo constitucional, de forma valorativa, assim como os valores da igualdade e da justiça, que juntos compõem a normatividade do princípio do acesso à justiça.
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil. (BRASIL, 1988).
De acordo com Alexandre de Moraes (2003, p. 48), o preâmbulo (partes introdutórias) de uma Constituição consiste em uma certidão de origem e legitimidade no novo texto e uma proclamação de princípios, demonstrando a ruptura com o ordenamento constitucional anterior e o surgimento jurídico de um novo Estado. Nele, deve constar os antecedentes e enquadramento histórico da Constituição, bem como suas justificativas e seus grandes objetivos e finalidades.
Para Pinto Ferreira, o preâmbulo possui efeito vinculante e normativo, pois seus princípios fazem parte do próprio texto constitucional. Se uma lei violar os princípios nele contidos, ainda que explicitamente, será inconstitucional.
De forma a ressaltar a soberania da Constituição Federal frente à formulação de políticas públicas, as palavras de Rodrigo César Rebello Pinho:
A Constituição é a lei maior do país, o vértice do sistema jurídico. Contém as normas fundamentais do Estado, estando todos sujeitos ao seu império, inclusive os membros do governo, e confere autoridade aos governantes, que só podem exercê-la dentro dos limites por ela traçados. A supremacia da Constituição decorre de sua própria origem, pois provém de um por constituinte originário, de natureza absoluta, bem como do seu caráter de rigidez, sobrepondo-se as normas constitucionais em relação a todas as demais normas jurídicas. (PINHO, 2012, p. 33).
Neste senda, uma política pública de acesso e prestação da justiça que garanta a efetividade do acesso à justiça, cumpre com seu dever constitucional. O caráter normativo dos princípios inseridos na própria Constituição é superior à elaboração de qualquer lei ou política. Isto, pois, o valor supremo está em normas e princípios basilares de uma sociedade caracterizada como democrática de direito; onde, no entendimento contemporâneo, eles devem ser avaliados em primeiro plano e qualquer lei se torna subsidiária na apreciação de um mérito em contraste com um princípio fundamental da sociedade. Aliás, grandes questões judiciárias são avaliadas baseadas em princípios e normas indispensáveis à uma sociedade fraterna.
Com isto, conclui-se as razões pelas quais o judiciário insere meios alternativos de resolução de controvérsias, em busca de uma sociedade harmônica e pacífica, a fim de garantir a efetivação de direitos fundamentais constitucionais, como o de cidadania e acesso à justiça.
3. POLÍTICA PÚBLICA DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ): RESOLUÇÃO Nº. 125
Em vista que o Poder Judiciário Nacional enfrenta uma intensa conflituosidade e sobrecarga excessiva de processos, o que gera a crise de desempenho e consequente perda de credibilidade, nesse sentido, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão ao qual cabe a finalidade específica de zelar e planejar, através de metas e programas, pelo serviço de prestação jurisdicional, cumulou a função de formular políticas públicas de acesso e prestação da justiça, de modo eficiente e efetivo em benefício à sociedade.
Boaventura de Souza Santos (2007) reconhece um protagonismo do judiciário em face da ampliação dos direitos sociais, o que implica tanto numa judicialização da política, como também, uma politização da justiça. Adverte que é preciso construir uma justiça cidadã, alicerçada numa cultura jurídica democrática para consolidar as mudanças iniciadas pela reforma do judiciário brasileiro.
Dessa forma, através da Resolução nº. 125, o Conselho institui a Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado de Interesses, no âmbito do poder judiciário, de modo a incentivar e adotar mecanismos consensuais de tratamento de conflitos. Por meio desta Resolução, estipulam-se a mediação e a conciliação como mecanismos alternativos de composição de litígios.
3.1 Conciliação
Antes da vigência do Código do Processo Civil de 1939, o juízo conciliatório era obrigatório; após sua vigência, por não tutelar a conciliação no procedimento comum ordinário, as suas regras rígidas se aplicavam à todos os conflitos, não havendo a tentativa de conciliação pelo juiz, nem mesmo na audiência de instrução e julgamento.
Em 1973, o novo Código incorpora a tendência global ao estímulo à conciliação e a insere como etapa na audiência de instrução e julgamento. Em 1984, foram instituídos juizados de pequenas causas (Lei 7.244/84). Esta lei teve início no Rio Grande do Sul, em 1982, com a criação de Conselhos de Conciliação e Arbitramento. A lei tinha o objetivo de simplificar e acelerar a prestação jurisdicional, com vista a harmonizar a justiça. A Lei das Pequenas Causas não foi a solução da questão, mas sim aproximou a Justiça ao cidadão de baixa renda, sendo a justiça comum considerada cara, morosa e complicada.
Já em 1988, com a nova Carta Constitucional da República, em seu artigo 98, inciso I, foi prevista a instalação de juizados especiais competentes para a conciliação cível e transação penal. A partir de 1994, a Lei 8.952 de reforma do Código de Processo Civil, impõe ao juiz o dever de tentar conciliar as partes em qualquer fase do processo (artigo 125, inciso IV), além de instituir audiência específica para este fim (artigo 331).
A palavra “conciliação” tem origem latina: conciliatione, que significa “ato ou efeito de conciliar; ato de harmonizar litigantes ou pessoas divergentes; congraçamento; acordo; concórdia”. (JR., 2011).
Se apresenta, assim, como uma tentativa de se chegar voluntariamente a um acordo neutro, que conta com a participação de um terceiro que intervém entre as partes de forma oficiosa e estruturada dirigindo a discussão e possuindo um papel ativo no sentido de sugerir hipóteses de composição. Possui inúmeras vantagens, como a rapidez, a confidencialidade e menores custos.
Simplificadamente, o objetivo primordial da conciliação é harmonizar e ajustar, de maneira amigável a questão controvertida entre duas ou mais pessoas, acerca de um negócio, um contrato ou uma estipulação qualquer. Pode ela se dar tanto na via judicial quanto amigavelmente em momento anterior ao ajuizamento de uma demanda judicial. (JR., 2011).
São destinados à conciliação todos os litígios instaurados no âmbito dos Juizados Especiais, onde é utilizado o modelo de processo sumaríssimo, com procedimento tutelado pela Lei 9.099/95. Esta lei enumera as causas em que o Juizado irá agir, e, consequentemente, propor a conciliação antes de seguir o trâmite normal do processo.
O artigo 3º da lei dispõe da competência do Juizado Especial Cível, estabelecendo que este tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor complexibilidade, sendo elas: as causas cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo (inciso I), as enumeradas no artigo 275, inciso II, do Código de Processo Civil (inciso II), a ação de despejo para uso próprio (inciso III) e as ações possessórias sobre bens imóveis de valor não excedente ao fixado no item I (inciso IV).
Já o artigo 60 da mesma lei, que dispõe sobre Juizado Especial Criminal, estabelece como de sua competência as infrações penais de menor potencial ofensivo, para conciliação, julgamento e execução. O atual entendimento de infração penal de menor potencial ofensivo, segundo Marcelo Amaral Colpaert Marcochi, abrange (i) todas as infrações da Lei das Contravenções Penal, (ii) crime cuja pena máxima não seja superior a 2 (dois) anos, (iii) crimes cuja pena de restrição de direito seja cumulada alternativamente com pena de multa e (iv) crime cuja pena seja apenas de multa.
3.2 A Mediação
O vocábulo “mediação” vem do latim mediatio – mediationis, no seu genitivo, e significa “intervenção com que se busca produzir um acordo” ou ainda “processo pacífico de acerto de conflitos, cuja solução é sugerida, não imposta às partes”. (JR., 2011).
Essa proposta diferenciada de tratamento dos conflitos emerge como estratégia à jurisdição tradicional, propondo uma metodologia que faça novas abordagens ao contexto conflitivo atual. Um terceiro parcial orienta as partes para a solução da controvérsia, sem sugestionar.
Nas palavras de Evaldo Rosario de Oliveira Jr.:
A mediação tem como função básica tentar encontrar um ponto de equilíbrio na controvérsia, aproximando as partes e captando os interesses que ambas têm em comum. A finalidade é objetivar uma solução que seja a mais justa possível para as mesmas. É uma tentativa de um acordo possível entre as partes, sob a supervisão e auxílio de um mediador. Uma das grandes vantagens da Mediação é que ela pode evitar um longo e desgastante processo judicial, pois a mesma se dá antes que as partes se definam por uma briga nos tribunais, resolvendo suas diferenças de forma extrajudicial, levando ao Judiciário apenas aquelas questões que não podem ser resolvidas de outra forma. Como exemplos práticos de mediação pode-se destacar os conflitos de vizinhança, separação, divórcio, conflitos trabalhistas etc. (JR., 2011).
Ao mediador compete a função de controlar e conduzir o processo, estabelecendo as regras de funcionamento. Os sujeitos definirão os termos do conflito, bem como tentarão encontrar solução adequada para ambos, de forma a manter o bom relacionamento. É uma técnica que conduz aos interessados encontrar, por meio de encontros assistidos, soluções de ganho mútuo. (CARVALHO, 2002, p. 58).
A mediação traz consigo, além de um novo caminho, a possibilidade de mudança de mentalidade, que proporciona o desenvolvimento de uma cultura do diálogo, a qual viabiliza que, em um conflito, as próprias partes envolvidas assumam responsabilidade frente à solução de suas controvérsias. Tão logo ganha espaço como importante instrumento de superação do excesso de formalismo no desenvolvimento do processo, almejando uma tutela efetiva, célere, adequada e sem prejuízos às garantias constitucionais. (MONTEIRO, 2009, p. 38).
3.3 Conciliação versus Mediação
A diferença fundamental entre conciliação e mediação reside no conteúdo de cada instituto. Na conciliação, o objetivo é o acordo, ou seja, as partes, mesmo adversárias, devem chegar a um acordo para evitar o processo judicial ou para nele pôr um ponto final, se por ventura ele já existe. Na conciliação, o conciliador sugere, interfere, aconselha, e na mediação, o mediador facilita a comunicação sem induzir as partes ao acordo. Na conciliação, se resolve o conflito exposto pelas partes sem analisá-lo com profundidade. (SALES, 2004).
Destarte, é considerável que exista diferença entre a quantidade de acordos conquistados na etapa de conciliação e de mediação. Isto ocorre, unicamente, pela diferença que há entre os dois processos. No primeiro, como já conceituado, há a participação de uma figura conciliatória, a qual proporá formas de resolver o conflito, e será guiada pela legislação específica. As partes se sentem mais seguras, e entendem que o acordo será justo, se formulado. Entendem que o conciliador possui conhecimentos jurídicos e poderá propor um acordo semelhante com qual seria a solução do mérito em juízo.
No entanto, no processo mediatório, a figura do mediador não propõe nenhum acordo. Sua função é, basicamente, estimular a formulação de um acordo sugerido pelas próprias partes. O mediador deixa claras as vantagens de entrar em acordo e evitar um trâmite processual, porém, ele nunca proporá uma opção de acordo. Poderá esclarecer dúvidas e acompanhar o diálogo entre as partes ao tentarem elaborar um acordo, para, se formulado, dar-lhe validade. Mas sua atuação não vai adiante.
Através disto, pode ocorrer que as partes não consigam entender-se entre si. Um poderá se sentir injustiçado ou tentará ser mais beneficiado. O que não ocorre na conciliação, onde o acordo é proposto pela figura conciliatória, concedendo-lhe um caráter justo – o que não impede das partes também proporem. Contudo, em nenhum momento alguma das partes poderá se sentir forçada a aceitar um acordo – as partes autora e ré deverão estar sempre cientes sobre a possibilidade de instaurar o processo, por não se sentir confortável com o acordo, tanto no juízo conciliatório, quanto mediatório.
Diz-se que tanto a parte autora quanto parte ré podem recusar a propositura do acordo e desejar o trâmite normal do processo, na busca de concretização exata de seus direitos e deveres. Isto, pois, após o início da busca da pretensão pelo autor, o réu também tem seu direito garantido de obrigar a continuidade da lide, de forma a provar sua independência frente a pretensão buscada pelo autor, ou mesmo garantir o que lhe é dever de verdade. Logo, a parte ré, igualmente à parte autora, pode negar-se a acordar com esta na audiência de mediação ou recusar a proposta do conciliador no juízo conciliatório.
Desta forma, não se considera perda de qualidade no procedimento mediatório frente ao conciliatório, tendo em vista as diferenças existentes entre os dois processos, cada qual com sua adequação específica frente a diversidade conflituosa existente. Assim sendo, um conflito poderá ser resolvido através do diálogo, e outro através da presença de uma figura conciliatória. Ou, até mesmo, somente com a imposição do juiz.
4. POLÍTICA PÚBLICA DE ARBITRAGEM ESTABELECIDA PELA LEI 9.307/96
A arbitragem é prevista pela Lei 9.307/96, conhecida como “Lei Marco Maciel”. Nela, as partes escolherão um terceiro, especialista na matéria discutida, que decidirá a controvérsia. Sua decisão tem a força de uma sentença judicial e não admite recurso.
Entretanto, este meio extrajudicial de resolução capaz de dirimir contendas entre particulares, pode ser determinada na elaboração do contrato, pela cláusula arbitral ou depois do surgimento da questão controvertida, pelo compromisso arbitral, ambos dando início ao que se convencionou chamar de juízo arbitral, sendo também obrigação das partes a indicação de um ou mais terceiros para serem árbitros. (JR., 2011).
Arbitragem nada mais é que a tentativa de equilibrar a vontade das partes através de um procedimento mais simples e célere. Só que antes de iniciá-lo os litigantes devem renunciar à Justiça Estatal, celebrando o chamado compromisso arbitral por meio de cláusula compromissória, convencionando previamente que os conflitos resultantes da relação jurídica entabulada serão dirimidos pelo Juízo Arbitral, nos termos da Lei de Arbitragem, podendo ser indicada a Câmara de Arbitragem escolhida, cuja deliberação final terá o mesmo valor de uma decisão judicial. A principal característica positiva da arbitragem é que a pessoa escolhida pelas partes para dirimir conflitos será a mesma do princípio ao fim, emprestando maior confiabilidade ao procedimento, o que nem sempre acontece nas questões levadas ao Judiciário. (GARROTE, 2011).
Nas palavras de Patricia Garrote:
Outro ponto positivo e bastante animador é que a arbitragem possui tempo certo para terminar, de seis meses ou outro previamente pactuado pelas partes, sob pena de nulidade, o que obriga os árbitros a se dedicar com mais profundidade e atenção ao deslinde da questão, pois há um prazo a cumprir. Ainda, de relevância máxima, da decisão emanada não cabe recurso, em total contraponto ao que ocorre no Judiciário, onde, após a sentença proferida, por vezes protelada por anos a fio, a possibilidade de interposição de incontáveis recursos manobrados por advogados pode ampliar e prolongar indefinidamente a solução do litígio. (GARROTE, 2011).
Embora hoje seja de relevada importância ao sistema de Estado atual, a questão fora levantada no Supremo Tribunal Federal (STF) e sua discussão teve duração de aproximadamente cinco anos. De acordo com Pedro A. Batista Martins, em procedimento peculiar de incidente de inconstitucionalidade arguido por membro da própria Suprema Corte, teve origem no contido no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição brasileira (inserido pela primeira vez na Constituição de 1946), que determina que “a lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
Como explica o autor, esse dispositivo foi inserido na Constituição de 1946 como forma de proteger os cidadãos de abusos cometidos pelas autoridades, sendo que no período imediatamente anterior à Constituição de 1946, o Brasil passou por um regime ditatorial onde era autorizada a instituição de tribunais à margem do Judiciário, onde a ampla defesa não era respeitada e as decisões proferidas não eram passíveis de revisão pelo Poder Judiciário. Denota-se, pois, que o referido dispositivo constitucional se dirige às próprias autoridades legislativas, pois objetiva proteger o cidadão de eventual abuso ou ato arbitrário cometido pelo Executivo ou pelo Legislativo.
Ainda no entendimento de Pedro A. Batista Martins, o cidadão, por seu turno, tem todo o direito de escolha: pode renunciar a direito, transacionar, solucionar a questão no Judiciário ou em sede arbitral. Foi esse, afinal, o entendimento que prevaleceu no julgamento da constitucionalidade da lei brasileira de arbitragem. Em dezembro de 2001, o pleno da Suprema Corte, por 7 votos favoráveis contra 4, validou in totum a Lei n. 9307/96.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Poder Judiciário praticamente detém o monopólio e a confiança da sociedade na solução de litígios. O cidadão que procura a Justiça outorga a um juiz poderes para solucionar controvérsias que, sozinho, não consegue resolver. No entanto, a cultura de acionar o Estado a cada conflito acaba sobrecarregando o Poder Jurisdicional, acarretando atrasos crônicos na solução dos litígios, que podem tramitar por anos e até décadas. A conseqüência é a descrença da população na Justiça, comprometendo desde a proposta original do Estado até o aparato judicial à disposição do cidadão. (GARROTE, 2011).
O Direito não está confinado apenas na lei, ele deve acompanhar satisfatoriamente as mudanças sociais. Esta transformação de paradigmas sobre a sociedade brasileira traduz a necessidade de políticas públicas que garantam celeridade, acessibilidade e economia nas experiências jurídicas dos cidadãos. Neste sentido, juntamente à necessidade de fortalecimento do princípio de acesso a justiça e de diminuição da sobrecarga do poder judiciário, surgem as formas extrajudiciais alternativas para solução de conflitos, retornando à sociedade como modelo de justiça comunitária.
Nesta seara, o Poder Judiciário zela pela proteção dos princípios e direitos fundamentais intrínsecos a todo cidadão, como parte de sua cidadania, muito embora a efetivação dos direitos ainda se mostre aquém do esperado. Perpassando pelo objetivo de solucionar o litígio, as formas alternativas interagem na raiz da controvérsia, evitando a instauração de um processo moroso e desgastante. Desse modo, torna-se mais célere a prestação jurisdicional e dá-se um tratamento mais adequado aos conflitos.
No que tange à intensa conflituosidade que atravessa pelo Judiciário, conclui-se que este cumpre com seu dever social ao possibilitar soluções extrajudiciais de conflitos, que abrange dois aspectos: a efetivação do acesso à justiça e a diminuição de sua sobrecarga. Destarte, considerando que a sociedade brasileira ainda carrega em si a ideia de que a melhor forma de resolver seus conflitos é através de um processo judicial, esta conscientização de pacificidade vem ocorrendo aos poucos, e, desta forma, perpassamos, atualmente, por uma precursora e vindoura mudança de mentalidade e cultura na resolução das controvérsias.
REFERÊNCIAS
BAROUCHE, Tônia de Oliveira. O juizado especial e a proposta de acesso à justiça. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2979, 28 ago. 2011 . Disponível em: <https://jus.com.br/revista/texto/19873>. Acesso em: 21 dez. 2012.
BRASIL. Constituição (1988) Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.
BRASIL. Código do Processo Civil (1973). Código do Processo Civil. In: Vade Mecum Saraiva. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 357 – 454.
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Fonte: Jus Navigandi.

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